terça-feira, 15 de dezembro de 2009

O Suicídio

Ainda hoje, infelizmente, em muitos segmentos de nossa cultura repudia-se a responsabilidade pessoal do suicida sobre seu ato, acreditando-se que sua atitude corresponda a um plano pensado e executado com lucidez e arbítrio plenos, em completo descaso intencional e proposital para com a vida.
Essa espécie de ousadia irreverente do suicida incomoda tanto as pessoas que, com freqüência, vemos até no meio médico, pessoas se omitirem ao atendimento de um suicida, assim como, infelizmente, aceitarem a idéia de que “quem quer se matar que se mate”.
Embora a discussão filosófica em torno do suicídio seja extenuante e inconclusiva, do ponto de vista médico a morte por suicídio é tão letal quanto aquela decorrente do infarto do miocárdio e, não obstante, é tão sujeita à abordagem terapêutica quanto esta. Se pensarmos no suicida como uma pessoa embriagada por uma química não alcoólica, mas de neurotransmissores, entenderíamos melhor a possibilidade desse ato ser satisfatoriamente reavaliado quando a pessoa voltar à normalidade psíco-neuro-química.

Em dados publicados pelo Centers for Disease Control and Prevention (Department of Health and Human Services), United States, 1997. MMWR 1998;47 (No. SS-3), pode-se entender que a tentativa de suicídio é mais freqüente em adolescentes femininas (27,1%) que masculinos (15,1%). Também se vê que 20,5% dos jovens examinados tinham considerado seriamente tentar o suicídio nos últimos 12 meses e, destes, 15,7% tinham feito uma plano específico para o suicídio, além disso, 7,7% dos adolescentes pesquisados tentaram o suicídio uma ou mais vezes nos 12 meses que precedem a pesquisa.

Portanto, o tema tem inquestionável relevância. ... Em artigo intitulado "A morte voluntária", o jornalista Antônio Goulart discorre magistralmente sobre o assunto. Veja um trecho:
"Praticamente inexistem justificativas generalizadas para o suicídio. Mas, em casos de suicídios concretos, já foram, apresentadas justificativas como ato de coragem ou de obediência a Deus ou ainda como mal menor.

Segundo muitos autores, a filosofia não conseguiu apresentar uma argumentação válida e conclusiva que demonstre a imoralidade absoluta do suicídio. O máximo a que ela pare­ce chegar é a conclusão de que o suicídio não é desejável eticamente, com base em uma perspectiva de prioridade ou preferências.
A auto-realização tem prioridade sobre a autodestruição
O suicídio corta radicalmente toda possibilidade de auto-realização.
As ações revogáveis tem prioridade sobre as não-revogáveis.

O suicida destrói irreparavelmente a sua criatividade, a possibilidade de colaborar para seu próprio desenvolvimento e para a construção social por meio de atos passíveis de revisão.
- A liberdade vivida por mais tempo e com maior intensidade tem preponderância sobre a liberdade prematuramente cortada. O homem é um ser que amadurece com o tempo: o suicídio acaba com esse processo de desenvolvimento.

Todos esses esforços filosóficos para criar uma base ética contra o suicídio não demonstram a sua imoralidade absoluta em qualquer situação.
Dentro do cristianismo e a partir de uma perspectiva religiosa, já se justificou a condenação absoluta do suicídio com base no mandamento de não matar. O "não matarás", tal como aparece na Bíblia, não apresenta qualquer referência em relação ao suicídio, muito embora posteriormente a tradição cristã tenha recorrido a essa proibição querendo incluir também o suicídio.

Santo Tomás e, com ele, outros autores basearam a imoralidade do suicídio em uma tripla razão:
"É absolutamente ilícito suicidar-se, por três razões. Primeira, porque todo ser se ama naturalmente a si mesmo; por es­se motivo, o fato de alguém se matar é contrário à inclinação natural e à caridade, pela qual a pessoa deve amar-se a si mesmo; daí o suicídio ser sempre pecado mortal, por ir contra a lei natural e contra a caridade. Segundo, porque cada parte, enquanto tal, é, algo de um todo; um homem qualquer é parte da comunidade e, portanto, tudo o que ele é pertence à sociedade, logo quem se suicida atenta contra a comunidade, como indicou Aristóteles. Terceira, porque a vida é um dom dado ao homem por Deus e sujeito ao seu divino poder, que mata e faz viver; portanto, quem se priva da própria vida peca contra Deus.
O tema do suicídio remete a questão do domínio do homem sobre a própria vida." Veja a página toda. Sabe-se hoje que, na grande maioria dos casos, o suicida tem uma percepção patologicamente falsa do mundo e dos valores, tal como um míope veria desfocada a realidade. Há inúmeros estados emocionais que limitam e distorcem a percepção da realidade, subtraindo da pessoa a devida liberdade, que os sadios têm, de considerar as condições de existência com a devida sensatez.

O desejável hoje, é que as pessoas sadias percebam suas responsabilidades em relação aos suicidas, tal como procedem em relação às crianças, aos demenciados, aos portadores de doença de Alzheimer, aos epilépticos durante suas crises, enfim que considerem os suicidas como portadores de limitações da liberdade necessária para lidar com a vida de forma sensata. Devemos levar a sério e estar disponíveis para qualquer manifestação de intenção ou ideação de suicídio, pois é grande o número daqueles que acabam cumprindo esse propósito.
Nos últimos anos tem havido um aumento no número de suicídios realizado por adolescentes mas, apesar de tratar-se de um acontecimento lamentável, suas dimensões são bem pouco conhecidas. O suicídio tem sido considerado a segunda principal causa de morte de jovens entre 15 e 19 anos, perdendo apenas para os acidentes de carros e de motos por alguns autores, no máximo como terceira causa de morte, por por outros autores.

Segundo Merrick (2000), as taxas do suicídio entre jovens de 15-24 anos nos Estados Unidos aumentaram de 2,7 a cada 100.000 jovens em 1950, para 13,2 em 1990. Em Israel, onde o autor realizou suas pesquisas, as taxas neste grupo de idade eram 2,9 em 1955 e de 5,0 em 1995. Mas, tanto em nosso meio quanto no exterior, normalmente os jornais não noticiam suicídios, quer de adultos ou de adolescentes pois, em geral, as famílias os encobrem na tentativa de se protegerem de uma dor maior, por conta desse infortúnio.
A literatura sobre suicídio na adolescência mostra a participação de fatores psiquiátricos, familiares, demográficos, e religiosos em torno do suicídio do adolescente. De fato, Renám García Falconi realizou um estudo para analisar essas variáveis na predição da intenção suicida em adolescentes. Foram estudados 51 adolescentes masculinos e 60 femininos, com idades entre 14 e 18 anos. Constatou-se que a ideação suicida, a ansiedade, o motivo existencial e a depressão estão fortemente relacionados com a intenção suicida.

Suicídio e Depressão

Entre os fatores psiquiátricos associados ao suicídio, em primeiro lugar está a depressão, alteração afetiva predominante no ato suicida, desde sua ideação, intenção até o suicídio de fato. Apesar de vários motivos ou explicações rodearem o suicídio dos adolescentes, como por exemplo, os fatores de ordem sexual, as drogas, timidez, fracasso escolar, problemas sentimentais, de relação familiar, e muitos outros, se a pessoa passar por tudo isso sem depressão ela, certamente, não se suicidará. Alguns autores consideram que, além da depressão, tem sido comum em adolescentes suicidas também um transtornos de conduta (Beyaert, 1999).
O suicídio da depressão não costuma ser espontâneo ou impulsivo, como acontece em alguns casos de esquizofrenia, de embriaguez patológica ou transtorno explosivo da personalidade. Na depressão o suicídio costuma ser elaborado em detalhes, com escolha do meio de se matar, hora e local do ato.
E o engano maior que se observa em nossa cultura é acreditar que só os adultos são vítima da depressão, só “quem tem problemas e luta com as dificuldades da vida” pode se deprimir. De fato, tanto o adolescente quanto o adulto podem ter depressão. No adolescente, entretanto, a depressão será pior ainda, pois nessa faixa etária o quadro depressivo pode ficar mascarado por outros sintomas, como por exemplo, a rebeldia, irritabilidade, mau humor, inquietação ou isolamento no quarto, etc (veja Depressão na Adolescência)
Um sinal de alerta para a possibilidade depressiva no adolescente é quando, por exemplo, uma pessoa alegre, jovial e expansiva, de algum tempo para frente, se transforma, abandona tudo o que apreciava, afasta-se de tudo e de todos, desinteressa-se, etc. (veja Quando se Deve Tratar Crianças e Adolescentes)

Os sintomas depressivos mais associados ao suicídio do adolescente dizem respeito ao severo prejuízo da auto-estima, aos sentimentos de desesperança e à incapacidade de enfrentar e resolver problemas. Esses sintomas podem não estar presentes no início do quadro, mas à medida que a depressão vai se tornando mais grave a baixa da auto-estima vai piorando, vão surgindo sentimentos de inutilidade e, progressivamente, o jovem vai ficando mais desesperado (sentimentos de desesperança). Daí em diante o quadro depressivo fica mais claro, com falta de entusiasmo, baixa energia, pouca ou nenhuma motivação, afastamento ou isolamento de atividades sociais, dificuldade em tomar decisões, baixo rendimento escolar, insônia ou dormir demais, sentimentos de culpa, eventual uso e/ou abuso de álcool ou drogas, ansiedade, medo, etc.
Dentro ainda dos sintomas depressivos, é importante considerar o teor do discurso do adolescente que alimenta intenção de suicídio. Sentimentos de culpa por sua simples existência podem estar presentes, como por exemplo, sentir-se como se fosse um "fardo para seus pais, para outras pessoas..." Costuma comunicar para pessoas de sua intimidade que "sua vida não tem sentido e que a sua morte seria um alívio para todos" e coisas assim.

Além da Depressão

A depressão não esgota as possibilidades patológicas do suicídio na adolescência e alguns outros quadros podem estar associados, possivelmente como causa psiquiátrica.
Felizmente não tão freqüente, a Esquizofrenia em seu surto agudo pode ser responsável por um número de suicídios na adolescência. A faixa etária dessa psicose no sexo masculino, principalmente, é por ocasião da adolescência e, dependendo da natureza dos sintomas delirantes pode levar ao suicídio. Além da imposição ao suicídio determinada por delírios auto-destrutivos, também a depressão que acompanha a esquizofrenia pode resultar em auto-extermínio.
Por várias décadas os sintomas depressivos da esquizofrenia foram menosprezados, voltando-se quase exclusivamente para o estudo dos sintomas psicóticos. Mas, na realidade, os sintomas depressivos são reconhecidos na esquizofrenia desde suas primeiras descrições por Kraepelin em 1896 e Bleuler em 1911 e este tipo de sintoma se acompanha de um maior risco de suicídio. Jorge Alberto Salton fala em 10% o número de esquizofrênicos que se matam.
Depois de passado o surto psicótico da esquizofrenia, costuma surgir a chamada Depressão Pós-Psicótica. Segundo levantamento bibliográfico feito por Rodrigo Afonseca Bressan (Shirakawa, 1998), a Depressão Pós-Psicótica tem sido relacionada a hospitalizações mais longas, à pior resposta a medicações, pior desempenho social, cronicidade, maiores taxas de recaídas e ao suicídio.

Os dados epidemiológicos atualmente aceitos em relação ao suicídio na esquizofrenia, citados por Bressan (in: Shirakawa, 1998) são os seguintes:
a) de 2% a 13% de todos os pacientes cometem suicídio
b) esquizofrênicos têm um risco de 10% a 20% maior que a população geral para cometer suicídio;
c) o risco é maior em pacientes do sexo masculino
d) o risco é maior em pacientes jovens e diminui com a idade.

Entre os fatores capazes de aumentar o risco de suicídio em pacientes esquizofrênicos destacam-se: o isolamento social, não ser casado, desempregado, história prévia de tentativa de suicídio, fortes expectativas sócio-familiares de boa performance, curso da doença crônico e com muitos surtos agudos, múltiplas internações, dificuldades no trabalho, história de depressão no passado e, evidentemente, depressão presente. Este último fator é de maior risco ainda, quando o sintoma proeminente é humor deprimido persistente e desesperança.
O Transtorno Dismórfico Corporal, muito comum em adolescentes, diz respeito à preocupação exagerada com um defeito inexistente ou ligeiro na aparência. Atualmente o Transtorno Dismórfico Corporal está relacionado à alteração patológica da imagem corporal que encontramos em pacientes anoréticos, os quais vêem-se mais gordos do que são ou até, vêem-se gordos quando, de fato, estão raquíticos. Pois bem. Entre pacientes com esse Transtorno Dismórfico Corporal, 21% tinha feito uma tentativa do suicídio, no mínimo, segundo Albertini (1999).
A Personalidade Borderline segundo o DSM.IV (Manual de Diagnóstico e Estatística das Doenças Mentais) é caracterizada por um padrão comportamental de instabilidade nos relacionamentos interpessoais, na auto-imagem e nos afetos. Há uma acentuada impulsividade, a qual começa no início da idade adulta e persiste indefinidamente.
O paciente Borderline freqüentemente se queixa de sentimentos crônicos de vazio. Há sempre uma propensão a se envolver em relaciona-mentos intensos mas instáveis, os quais podem causar nessas pessoas, repetidas crises emocionais. A CID.10 diz ainda que esses pacientes se esforçam excessivamente para evitar o abandono, podendo haver quanto a isso, uma série de ameaças de suicídio ou atos de auto-lesão. O suicídio concreto, quando acontece em portadores de Personalidade Borderline, geralmente se dá por engano, ou seja, quando sua auto-mutilação ou teatralidade não foi bem planejada ou fugiu ao seu controle.

O(a) Adolescente e o Ato de se Matar
Garrido Romero (2000) considera que a tentativa do suicídio é a emergência psiquiátrica mais freqüente nos adolescentes. A idade média dos pacientes admitidos com intoxicação voluntária em serviço de emergência para crianças e adolescentes foi de 15,6 anos, sendo 87% deles meninas. Já haviam passado por atendimento psiquiátrico prévio 60,9% desses jovens.
A substância tóxica mais usada para esse tipo de tentativa de suicídio por intoxicação voluntária era originária de remédios que, na maioria das vezes (82,6%), foi obtida no próprio lar dos adolescentes. Os resultados sugeriram ao autor que a prevenção do suicídio nessa faixa etária requer, além da avaliação dos riscos de suicídio, também a vigilância sobre o acesso aos medicamentos da casa.
No adolescente a comunicação principal se dá através da ação, ainda que na ausência dessa, ou seja, o isolamento e a apatia geral (falta de ação) também é, para o adolescente, uma forma de comunicação. Como nós, também os clínicos em geral, percebemos grande dificuldade em aplicar nos adolescentes a orientação de ser expectante, ou seja, de esperar que o tempo proceda alguma mudança em suas vidas, esperar que problemas se resolvam. Não, ele(a) não espera. O adolescente é impulsionado à ação, ao fazer ...
A depressão no adolescente é atípica, como dissemos, na medida em que ele(a) não tem recursos para discursar sobre seus sentimentos, de externar a problemática existencial e emocional pela qual está passando.

Aí, neste caso, diante de eventual introversão, da dificuldade em demonstrar sentimentos, da coerção que o meio cultural tem sobre a manifestação emocional, a ação acaba substituindo esta, digamos, “inabilidade” de exteriorizar sentimentos. Para o adolescente, a solução de seus conflitos pode se traduzir na atitude de recorrer às drogas, ao álcool, à rebeldia e desobediência, à promiscuidade sexual, aos comportamentos agressivos e, inclusive, ao suicídio. Enfim, alguma comunicação não verbal dos seus sentimentos pode aparecer no adolescente.
A administração do comportamento suicida no adolescente não é uma coisa simples. Primeiramente, alguns autores consideram que um terço desses adolescentes fazem repetidas tentativas de suicide, aumentando assim o risco de morte. Em segundo, 70 % dos pacientes que tentam suicídio não têm um transtorno mental apropriadamente diagnosticado, embora necessitem de cuidados nessa esfera (Pommereau, 1998). Apesar disso, na prática, temos observado exatamente o contrário, ou seja, com exceção dos cuidados físicos dispensados ao adolescente suicida nos serviços de emergência, a expressiva maioria dos hospitais não dispõe de um serviço de acompanhamento psiquiátrico.
E não é apenas ao suicídio clássico e franco que o adolescente deprimindo recorre; muitas vezes ele(a) pode tentar suicídio de forma indireta e inconsciente, dirigindo de maneira imprudente, envolvendo-se em acidentes facilmente evitáveis, abusando de drogas e álcool, lidando insensatamente com armas de fogo, enfim, facilitando para que o acaso possa acabar com sua vida. Segundo Antônio Goulart, de modo geral, os jovens morrem principalmente de causas violentas e para cada suicídio de um adolescente, existem 10 tentativas. As moças tentam 3 vezes mais o suicídio que os rapazes, mas os rapazes alcançam a morte mais freqüentemente que as moças e utilizam métodos mais violentos.
Sobre a tendência popular de se desvalorizar quem fala muito em se matar, e levar mais a sério quem é retraído ou mais calado, Handwerk e colaboradores (1998), de fato, encontraram uma relação inversa entre a letalidade da tentativa de suicídio e o fato da pessoa avisar mais enfaticamente que quer se matar. Segundo esse autor, algum tipo de uma comunicação precede 80% das tentativas de suicídio ou suicídios concretizados em adolescentes. Em 46 casos estudados, os mais letais fizeram poucas comunicações sobre a intenção suicida, ao contrário daqueles com mais comunicações, cujas tentativas foram menos letais. Isso, entretanto, não nos autoriza a menosprezar adolescentes que falam muito sobre a intenção em se matar.
O jornalista Antônio Goulart, em seu artigo sobre a Morte Voluntária, tece comentários sobre aspectos religiosos atrelados ao suicídio. Veja um trecho sobre as perspectivas histórico-religiosas do suicídio:
"Historicamente a atitude da sociedade em relação ao suicídio variou da admiração à hostilidade, punição, irracionalismo e até superstição. As antigas lendas gregas descrevem o suicídio como bom e admirável. Os estóicos e epicureus viam o suicídio como uma solução aceitável para muitas situações intoleráveis de vida. Mais tarde os gregos e romanos condenaram o suicídio como uma ofensa política contra o Estado porque a comunidade perdia um membro útil. Havia também uma atitude de superstição que envolvia o suicídio, particularmente na Idade Média. Por exemplo dizia-se que se uma mulher grávida parasse no túmulo de um suicida a criança morreria de suicídio.
Através da história, a religião desempenhou um importante papel na formação de atitudes perante o suicídio. Biblicamente, nem o Antigo Testamento nem o Novo Testamento proíbem ou condenam o suicídio. Existem 6 exemplos de suicídio no Antigo Testamento e um no Novo (Judas).
Por vários séculos, a Igreja não teve uma posição específica sobre o assunto. De fato os primeiros cristãos suicidavam-se em grande número por razões religiosas. Santo Agostinho e mais tarde São Tomás de Aquino definiram a posição da Igreja, vendo o suicídio como algo pecaminoso, como algo moralmente mau sendo uma transgressão do 5o. mandamento "não matarás". A Igreja recusava aos suicidas os ri­tos funerais e enterros. Normas proibindo suicídio tem sido fortes no catolicismo, protestantismo, judaísmo e islamismo. Somente as religiões orientais são mais tolerantes no assunto.
Gradualmente as atitudes da Igreja passaram para o governo e foram incorporadas na lei civil. Como resultado o suicídio passou a ser um crime, uma violação contra as instituições sociais e começou a ser punido severamente. As autoridades confiscavam a propriedade da vítima, os sobreviventes tinham que pagar uma multa para o tesouro nacional e o corpo por vezes era exposto à execração.
Finalmente, no séc. XIX, intelectuais e filósofos questionaram estas atitudes e houve uma mudança. O suicídio passou a ser visto como uma manifestação de loucura, indicando que a pessoa não estava com a mente sadia. Tal abordagem era menos moral e se servia das descobertas no campo médico e social. Atualmente o suicídio não é visto exclusivamente como um problema moral, mas também como um problema de saúde mental. Muitos peritos no assunto acreditam que a maioria dos suicídios são compulsivos e irracionais. Aqueles que tiram a própria vida, estão emocionalmente perturbados e agem compulsivamente ou então a percepção da realidade é tão distorcida pela angústia que a liberdade de escolha praticamente não existe." Veja a página toda.
Veja, transcrevendo ainda a página de Antônio Goulart, algumas perguntas e respostas sobre suicídio:
"Quem tira a própria vida está fora de si, sempre?Não necessariamente. Embora muitos pacientes sejam diagnostica­dos como "loucos" por tirarem a própria vida, pesquisadores acreditam que as vítimas de suicídio não procurariam tanto a morte, e sim um meio de fugir ao sofrimento. Os suicidas, assim, sentir-se-iam perdidos pelas circunstâncias da vida e encontrariam na morte o único meio de fuga. No entanto, mesmo na morte, eles desejariam que alguém os resgatasse da situação. Por isso, assumir que o suicídio é um ato de insanidade não apenas pode ser falso, como constitui uma indelicadeza para com os parentes.
Existem sinais de aviso?A resposta é sim e não. As estatísticas mostram que 80% das mortes por suicídio foram precedidas de alguma pista ou sinais. Contudo, muitos deles estão tão codificados ou imperceptíveis que mesmo um conselheiro profissional pode não os perceber. O percentual de probabilidade de intenção de suicídio nunca deve ser esquecido. Embora o ato final de tirar a própria vida possa ser produto de um longo processo, ele nunca será inteiramente previsível por alguém, até que aconteça.
Os suicidas sempre deixam uma carta ou bilhete?Não. Em muitas mortes aparentemente por suicídio não existem no­tas, cartas ou bilhetes, e somente as circunstâncias podem indicar que a morte foi causada pela própria pessoa. Legalmente, o médico deve registrar o óbito como suicídio, homicídio, acidente ou por causa natural. Para muitas pessoas, tais tipos de morte permanecem um mistério insolúvel. Este é um ponto em que amor e lei nunca estão de acordo. plenamente seguro de si." Veja a página toda. Do ponto de vista ético e filosófico o suicídio é bastante complicado. Até a sabedoria popular não diz, ao certo, se o suicídio é um ato de desespero covarde ou desespero corajoso. Vê-se a dimensão do problema filosófico nas palavras de Albert Camus, para quem "só há um problema filosófico verdadeiramente sério: o suicídio".
E, de fato, o suicídio é uma questão tão séria que não deve ser deixado sob responsabilidade exclusiva da psiquiatria. Seus aspectos extra-médicos, ou seja, seus componentes éticos, religiosos, morais, culturais e circunstanciais convocam ao seu estudo e compreensão o filósofo, o intelectual, o psicólogo, o religioso, o escritor, o sociólogo e por aí afora.
Segundo o autor italiano Cesare Pavese (1908-1950), o suicídio pode ser compreendido como uma solução falida e mal adaptada de uma crise provocada pelo estresse real em uma pessoa psiquiatricamente predisposta. Esta descrição é retirada da própria biografia de Pavese, o qual cometeu suicídio no pico de sua carreira mas, segundo seu diário, vinha refletindo sobre isso por muitos anos antes (Scherbaum, 1997).
Por pessoa "predisposta", segundo as palavras de Pavese, em primeiro plano entendemos aquelas com propensão à depressão e, em segundo, as portadoras de Transtorno Borderline da Personalidade. Essa possibilidade Borderline foi investigada por Muttini em 1997, através do teste de Rorschach. Entretanto, não podemos desprezar os fatores culturais atrelados ao suicídio. No Japão, por exemplo, entendemos que a extrema solicitação cultural dirigida à criança e ao adolescente podem ter papel preponderante na atitude suicida nessa faixa etária (Kawabata, 2001).

Suicídio e a Família

Variáveis familiares costumam estar fortemente associadas com o ato suicida de adolescentes. Algumas dessas variáveis dizem respeito à estrutura familiar, bem como às e relações entre os membros da família (Kurtz & Derevenske, 1993; Paluszne, Davenport & Kim, 1991; Wagner e Cohem, 1994). Inclusive, alguns autores realçam o aumento de risco quando existe historia familiar de violência e de depressão. Tem sido observado também que o risco de cometer suicídio em famílias com apenas um dos pais é maior do que nas famílias com ambos pais, principalmente no caso de jovens adultos do sexo masculino (Diekstra, 1997).
Olsson, em 1999, estudou 3 grupos de 75 estudantes cada: um grupo de adolescentes com história de tentativa prévia de suicídio, outro grupo com depressão mas sem tentativas do suicídio e, finalmente, um outro grupo sem depressão. Comparou a existência de problemas na família e atos violentos praticados por adolescentes desses 3 grupos. Problemas de família eram muito mais comuns entre adolescentes do grupo que havia tentado suicídio do que nos outros 2 grupos. Assim como as histórias de abuso físico também foram mais encontradas em adolescentes que haviam tentado suicídio do que entre estudantes deprimidos e saudáveis.
Os adolescentes com tentativas de suicídio tinham cometido mais atos violentos e apresentavam mais Transtornos de Conduta e abuso do álcool do que os outros grupos e houve forte relação entre o abuso do álcool e violência. A conclusão de Olsson foi que os adolescentes com tentativas do suicídio experimentam mais violência da família, em especial abuso físico, e têm um comportamento mais violento do que adolescentes deprimido e sadios.

Suicídio e Homossexualismo

O PsicoSite, citando pesquisa publicada na revista Archives General Psychiatry (1999; 56: 867-874), diz que "a média das pesquisas de tentativa de suicídio entre adolescentes homossexuais ou bissexuais é de 31% variando entre 20 e 39%. Estudos epidemiológicos mostram que entre 18 e 24 anos de idade as tentativas de suicídio entre os homens é de 1,5% e para as mulheres de 3,4%. Entre 25 e 44 anos a taxa é de 4%. Acredita-se, segundo esses estudos, que a não conformidade com sua condição sexual gera o comportamento de auto-agressão."
Nessa pesquisa utilizou-se de uma mostra composta por 103 pares de irmãos gêmeos do sexo masculino. Foram investigados 4 sintomas básicos: pensamentos sobre a própria morte, desejo de morrer, pensamentos sobre cometer suicídio e tentativa de suicídio. Conclui, PsicoSite, dizendo que a orientação homossexual está significativamente relacionada aos sintomas ligados ao suicídio, em comparação com os irmãos heterossexuais, constatando um aumento significativo do risco de suicídio entre os homossexuais masculinos, independente do abuso de substâncias psicoativas e outros transtornos psiquiátricos.

para referirBallone GJ - Suicídio na Adolescência, in. PsiqWeb, Internet, disponível em 2003

Bibliografia consultada

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Beyaert F, Erlicher P - Adolescence and suicidal tendencies, Imago, 1999, 6/1 (5-12)
Garrido Romero R, Garcia Garcia JJ, Carballo Ruano E -Voluntary intoxication as a form of attempted suicide, Anales Espanoles de Pediatria, 2000, 53/3 (213-216)
Handwerk ML, Larzelere RE, Friman PC, Mitchell AM - The relationship between lethality of attempted suicide and prior suicidal communications in a sample of residential youth, Journal of Adolescence, 1998, 21/4 (407-414)
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Paluszne M, Davenport C e Kim WJ - Suicide attempts ande ideation: Adolescents evaluatede am a pediatric warde. Adolescence; 1991, Vol. 26(101) 209-215
Pommereau X - Approaches in adolescent suicide, Revue du Praticien, 1998, 48/13 (1435-1439)
Scherbaum N - Adolescence and chronic suicidal tendencies - The biography of the Italian author Cesare Pavese (1908-1950), Fortschritte der Neurologie Psychiatrie, 1997, 65/1 (16-22)
Shirakawa I - O suicídio como momento psicótico. Bal Priquiatr, 1987, 20:20-22.
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